Não, não me refiro ao conteúdos aprendidos nas aulas online ou no TDT! Falo de muitas outras coisas que, face ao panorama do confinamento social obrigatório, as nossas crianças e adolescentes ganham (e muito!) ao ficarem em casa.
Com efeito, independentemente da ansiedade e medos que habitam por estes dias as mentes de pequenos e graúdos, é inegável as oportunidades únicas que temos de, enquanto pais e trabalhadores, orientarmos os nossos filhos para que aprendam por exemplo, que uma casa dá trabalho; que a roupa não se lava ou arruma sozinha; que as refeições não surgem como por magia à mesa e que, a louça não se lava ou seca sozinha!
E eis que no meio das novas rotinas, por vezes impiedosas por causa de horários de aulas, jornadas de teletrabalho e afins, ensinamos às nossas crianças o valor da organização, da autonomia, da planificação e, sobretudo, da distribuição de tarefas.
"- Mãe, pai, como é que conseguem trabalhar o dia todo, cozinhar e arrumar tudo isto, sem estarem cansados?"
A verdade é que também nós estamos cansados, mas também adoramos estar numa casa limpa, arrumada e organizada, como se também isso nos arrumasse a alma e a mente (muito mais do que estamos dispostos a admitir!)
De repente, algumas das rotina que os pais "têm a mania de impor" (palavras deles há umas semanas atrás!) começam a fazer sentido, por exemplo:
o fazer as camas e abrir as janelas dos quartos para arejar;
colocar a roupa do avesso no cesto de roupa e separá-la em roupa clara ou escura sem consequências nefastas para nenhumas das peças envolvidas;
a "destruição dos fortes", construções de legos, pinturas e afins porque os brinquedos também precisam dormir arrumados;
a lavagem da loiça e utensílios de cozinha após experiências (sempre bem sucedidas!) na cozinha;
a distribuição de tarefas de arrumação, limpeza e organização, onde todos cumprem com a sua responsabilidade em simultâneo.
Sei que parece regime militar, mas o certo é que, ao fim de algumas semanas, tudo se torna automático e, pasme-se, eles vão muito além do que lhes é pedido, tomando a iniciativa e a dianteira quando se apercebem, sem nada nos dizerem, que o dia correu menos bem!
Cá por casa temos sido presenteados com algumas refeições confecionadas pelos nossos filhos que em equipa mais harmoniosa (ou não!) nos surpreendem! Desde as famosas omeletes, à massa com legumes e atum (sempre à mão) ou peixe grelhado no forno que demorou muito mais do que suposto, pois estavam com medo de o queimar!
Garanto-vos que depois deste episódio, foram eles que exigiram que lhes ensinássemos a usar o forno... porque "chefes de renome" não podem fazer os clientes esperar diziam eles!
E tudo é delicioso, porque fazem questão de provar antes de servir para evitar surpresas desagradáveis e porque também eles têm um brio enorme no que fazem, consultando na internet como fazer, ajustando aos ingredientes que têm e as quantidades necessárias ao número de pessoas cá em casa. - aprendem a planificar, a adaptar-se e a serem criativos!
Por outro lado, aprendem que, se juntarem demasiado detergente á água com a qual irão limpar o chão, demorarão o triplo do tempo a limpar e secar (para além de uma ou outra escorregadela sem consequências de maior) ou, se aldrabarem na loiça terão de a lavar novamente antes de a poder usar de novo, aprendendo claramente com os erros!
Aprendem enquanto fazem tudo isto? Crescem mais autónomos e seguros? Sim e sim! Mas, mais do que isso, compreendem que a casa também é deles e todas as regras e rotinas (outrora impostas) fazem sentido e são, acima de tudo necessárias!
Confesso que estas experiências e aprendizagens nos têm conectado como nunca enquanto família, ao ponto de nos sentirmos verdadeiramente privilegiados de passar todo este tempo juntos.
Não julguem porém que tudo é um mar de rosas. Não é! E sim, existem momentos em que também nós adultos parecemos fazer birra... mas até isso eles aprendem a respeitar - o nosso tempo!!
Serão estas aprendizagens menos importantes do que as que a escola lhes proporciona? Não creio! Serão avaliadas em exame nacional? De todo!! Farão parte do seu currículo? Duvido!
Serão importantes para a sua vida, autocuidado e relacionamento com os outros?
Muito!!
Tenhamos pois a coragem e a consciência de aproveitar a oportunidade que este isolamento social nos trouxe de sermos melhores pais e, sobretudo, mais presentes!
Isabel Valente,
Mãe, professora e mestre em Educação
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